sexta-feira, 17 de agosto de 2007

verde garrafa

Corria decidida a chegar em lugar algum, apenas corria. Olhava a tela colorida e corria, corria, corria e suava. Sentia o rosto e as mãos molhadas, sabia que se pensasse em algo estava sujeita a cair. Se caisse ali quebraria os dentes, o nariz e talvez o braço. E como não teria dinheiro para arrumar os dentes, o melhor a fazer era não pensar em nada.
As imagens na TV eram apenas pessoas que mexiam os lábios, pois o som da voz não acompanhava o movimento deles. A princípio era engraçado depois irritante. Sentiu vontade de coordernar a boca das pessoas como se todos que estavam ali fossem fantoches. Mas ao primeiro sinal de tropeço, lembrava que não podia pensar e já estava ali, pensando.
Voltava então para a tarefa de não pensar e por pior que lhe parecesse, por alguns longos minutos conseguia não pensar em nada. Conseguia não desenvolver nenhuma linha de pensamento e o que talvez fosse ainda pior, sentia-se bem assim.
Quando o sinal tocou, olhou novamente a TV e reconheceu ao longe as telhas francesas do telhado de uma esquina, mais um pouco reconheceu um jardim no qual não pode entrar. Pensou rápido no sorvete que tomou na cidade do pintor e na tarde feliz que passou por lá. Não corria mais, mas preferiu pensar que não podia pensar e saiu correndo e agora decidida a chegar enfim em algum lugar.
Sentou sozinha no banco, distraiu-se dormiu. Sentiu um braço encostando e um cheiro morno que vinha do seu lado esquerdo, acordou assustada e viu uma entidade verde ao seu lado. Uma senhora inteira de verde, só não tinha cabelos e unhas verdes por algum acaso do destino. E não eram tons de verde, mas só um verde. Ara aquele verde garrafa de refrigerante Brahma. Poderia ser confundida com uma viúva, devido a trajes tão pesados, mas como vestia verde não dava para ser. Perdeu tanto tempo olhando cada detalhe, cada broche, cada pedra de vidro do colar vistoso que ao quando acordou daquele mundo verde garrafa, viu pela janela uma cidade completamente diferente daquela de todosantodia.
Desesperou-se calada, suava frio por mais um dia de pura incompetência. A senhora verde, além de verde era sensível. Segurou-a pela mão e explicou o caminho a ser tomado. Indicou remédios para a memória, para incompetência, para a distração e para todo o vazio que sentia. Entregou um papel dobrado em forma de barco, mandou que ela descesse ali e não se desfizesse do barco e nem desfizesse o barco. Era como a corrida anterior não pensava, só corria.

2 comentários:

undergroundousubway disse...

será que vc pode me dizer onde se arruma o remédio para vazio?? e será que junto dele, não tem uma outra caixinha de remédio para solidão??? encomendaria duas...

Anônimo disse...

Já te disse que ADORO os teus textos? Pois é, simplesmente ADORO!
Achei que te veria no openhouse da Livinha... humpf!
Beijos querida