Aquele gesto e só aquele, entre mil gestos perdidos que importava. Acordou assustado no ônibus com essa frase na cabeça. Ao longe ela de casaco vermelho costurava caminhos entre a multidão. Entre todos os transeuntes, apenas aquele passo despretensiosamente cadenciado demonstrava ter algum sentido. Ele, acordava sempre no mesmo ponto de ônibus e mesmo com o trânsito imprevisível, todos os dias observava a mesma moça quase sempre no mesmo horário.
E como se houvesse uma linha que ligasse os dois, ambos executavam movimentos diversos durante a manhã para se encontrarem no mesmo local.
Ela, a moça do casaco vermelho, azul, verde, preto, marrom, roxo, cinza tinha a escala pantone inteira em seu armário, sentia frio todas as manhãs, mas nunca soube que era observada e que seu andar era a única ato que fazia sentido na vida de alguém, ainda mais dele. Logo ela, que há muito tinha deixado de ser a menina que sempre desejou passar embaixo do arco-íris para virar homem e não ter que se subordinar mais às brincadeiras e vontades dos irmãos e que hoje não sabia muito bem lidar com o real. Logo ela.
Caso se encontrassem, não se reconheceriam. Ela sempre de costas, passo rápido. Ele sempre no ônibus arraigado ao banco. Até que ele descesse no ponto errado e chegasse, um dia atrasado ao trabalho, até que ela parasse e ao invés de só enxergar o falho arco-íris olhasse para trás, não se reconheceriam mesmo. E enquanto não se vive a vida mesmo, ela fica lá dormindo gostoso e sonhando bonito.
Nenhum comentário:
Postar um comentário