sábado, 2 de julho de 2011

O que só eles sabem.

Na janela do quarto deles havia um buraco, imperceptível para quem passava na rua. Só os dois sabiam da existência e não eram necessárias palavras para garantir o segredo a sete chaves.

Ela, muito discreta disfarçava bem o gosto pela vida alheia. Mas sempre que escutava algo estranho na rua, sempre nos horários que o trem passava devaaaagar, sempre que a tarde caía e ele estava no trabalho e os filhos na escola e só existia ela e a tarde dela, corria para o tal buraco da janela e ocupava-se do mundo alheio.

Ele, muito atarefado, só notava a existência do buraco quando a pegava agachada espionando a rua. Às vezes arriscava uma espiada, mas sentia-se invadindo o mundo dela. Embora nenhum dos dois soubesse mais o que era dele e o que era dela, aquele evento delimitava os dois corpos.

Sábado a noite, o havia proibido de tomar o trem na manhã seguinte. Ele, obediente e compadecido concordou com a cabeça e garantiu que naquele domingo, nada de trem.
Domingo pela manhã, ele levanta, vai para rua e avisa de novo, nada de trem. Ela, desconfiada e conformada, aguarda o horário do trem já a espreita. Quando finalmente ouve o apito e lentamente o trem vai despontando na paisagem. Lá está ele, sentadinho na janela, mostrando a língua e fazendo uma banana para um imperceptível buraco.

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