domingo, 10 de junho de 2007

Falar de mim é fácil, difícil é ser eu

"Falar de mim é fácil, difícil é ser eu", era com essa frase latejando no pensamento que entrou novamente naquela que era uma loja de tecidos, com estantes de madeira e um senhor, calmo, quieto parado na porta, esperando apenas vender mais três metrs de fazenda e ir embora pra casa. Fechar aquilo de vez, acabar com todas aquelas fazendas intermináveis.
Agora ela não era mais um loja de tecidos, não tinha mais estantes de madeira, nem um velho calmo e quieto parado na porta. Tinha agora milhares de linhas, fitas de cetim, paetês, botões, agulhas, giz para marcar roupa, passamanarias, novelos de lã, bordado inglês, transfers, decalques, tudo menos fazendas. Agora quem atendia era um homem de 30 anos, com uma perna manca. Talvez, assim como Roberto Carlos ele teria uma perna mecânica, mas falava tão polidamente que o falar chamava mais atenção do que o andar torto.
E o "falar de mim é fácil, difícil é ser eu", continuava ali latejando, como quando se bate o dedo mindinho do pé na quina da porta. Pensou, lembrou, tentou trazer lá do fundo na memória para quem havia contado sobre o velho e sobre as estantes de madeira.
De repente tudo se ligava, o vendedor da primeira loja que dizia "aqui a gente só vende fita de cetim em pedaços, rolo você encontra mais lá na frente, rolo importado da china, que sai mais barato", lembrou do velho falando: "daqui a pouco só vão vender aqui fazendas importadas da china, sai mais barato". Sim, o velho tinha razão tudo importado, só errou no produto.
Só errou no produto, e ela que não conseguia mais ser ela ou aquela que um dia falou para quem não sabe quem é sobre aquele velho, que não tem perna mecânica, mas era calmo e quieto. Falou sobre a estante de madeir, sabia de cor como era a estante, madeira escura talvez imbúia.

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